31.12.16
Crônica diária
Agora sem mistério
Alguns dias atrás
escrevi sobre as expressões cuja origem desconhecia. E no mesmo dia que
publiquei o texto, lendo Leonardo Padura, em seu livro "Ventos de
Quaresma" encontrei: "...pensando na morte da bezerra." Minha
mãe usava muito essa expressão nas décadas de 50 e 60, e nessa época Padura
estava nascendo (1955) em Cuba. Mais um mistério. Quem e por que teria usado
essa expressão? O título desta crônica seria "Segundo mistério". Mas o
Fernando Machado e o José Luiz Fernandes se apressaram a dizer que existe um
livro que desvenda todos esses "mistérios". E são muito menos
"excitantes" que as versões populares. Dou um exemplo: "Bonita
pra chuchu" segundo eu li tinha vindo do nome da prostituta francesa,
Chouchou na década de 20, no Rio. A versão do livro, segundo o José Luiz é pelo
fato de chuchu dar em abundância. Muito. Daí, feia pra chuchu, gorda pra
chuchu, etc. Faz sentido, mas não tem a menor graça. "Pintando o
caneco" o José Luiz também esclareceu. Agora falta "Pensando na morte
da bezerra".
31 de Dezembro de 2016
Crônica do Alvaro Abreu
Luiz Mococa
Na
semana passada perdi um grande amigo de infância. Ele era da segunda
leva de amizades que fiz aqui em Vitória, a partir de 1958, A primeira,
com a garotada da antiga Rua da Árvore e a outra com as mais de trinta
crianças que moravam numa das duas quadras da Rua Madeira de Freitas.
Luiz Fernando era um dos cinco filhos de seu Anacleto e morava em frente
da nossa casa. Naquele tempo sem TV, os vizinhos se conheciam e muitos
se frequentavam. As amizades surgiam nas brincadeiras de rua, nos papos
de varanda e se consolidavam nos banhos de mar, nas pescarias e nas
festas do Praia Tenis Club. Nos finais de ano, nossa rua era fechada ao
trânsito para comemorar o aniversário de dona Natalice, a mãe dele. Somos a Turma da Madeirinha.
Luiz
Mococa era uma pessoa ímpar e sua morte me traz de volta um tempo muito
bom que vivemos juntos, incluindo as peladas disputadas no barro da rua
e na areia de Camburi e os passeios no seu jipe Candango. Como
escoteiros do mar, acampamos na Ilha do Frade, onde chegamos a bordo de
um escaler da Marinha. Ele lia tudo sobre a Segunda Guerra. No tempo dos
festivais, Luiz aprendeu a tocar violão e a cantar “Gatinha manhosa”,
seu hit. Nos formamos em 1970 e pra comemorar, junto com mais uns dez
colegas, fomos numa Kombi alugada até o Uruguai, a caminho de Bariloche.
Saudosista, sempre me sugeria contar aquela viagem em crônica.
Luiz
era uma pessoa doce que comia tanto quanto um passarinho e gostava de
uma cachacinha. Quanto mais bebia, mais calado ficava, piscando mais do
que o normal. Ele adorava fogo, acender fogueira e soltar foguetes.
Habilidoso, começou a fazer, com madeira e papelão, miniaturas de
barcos, veleiros e aviões. Na quinta feira passada, conversamos
alegremente na confraternização da nossa turma de engenharia.
Discretíssimo e com certa cumplicidade, ele me mostrou suas obras mais
recentes no celular. Combinamos fotografar tudo com lentes potentes e
luz adequada e fomos pra casa dormir. Na sexta feira, o cemitério de
Santo Antônio estava lotado de gente incrédula.
Vitória, 28 de dezembro de 2017
Alvaro Abreu
Escrita para A GAZETA
Ilustração: Amarildo
Ilustração: Amarildo
Nota do autor
NOTA DO AUTOR
(próximo livro :"INTIMIDADES CRÔNICAS")
No dia 30 de Março de 2012 iniciei postagens diárias do que chamei (equivocadamente?) de crônicas. Na verdade são micro textos, ou mini crônicas, que é o máximo palatável para o leitor apressado das redes sociais. As ditas crônicas foram postadas em dois blogs e na minha página do Facebook. Por terem se iniciado no final de Março, completaram 300 no dia 25 de janeiro de 2013. Reunidas num livro, levou o título de "Agudas e crônicas"[2013]. Sem nenhuma seleção ou censura foram postadas nos trezentos dias que se seguiram e publicadas sob o título "Dance comigo" outro livro em 2016. As seguintes 300 foram reunidas, na mesma sequencia diária, no "O diabo desse anjo" [2017]. Outras tantas no "Textículos, pequenos textos", seguidas do "Intimidades crônicas" que teve sua ultima postagem dia 30 de Dezembro de 2016. O distanciamento entre a criação dos textos e suas postagens diárias, da publicação em livro, acabou dando uma nova perspectiva. Lidas tanto tempo depois propicia uma nova visão dos fatos, e principalmente do meu pensamento à época. Muitos equívocos, e alguns acertos ficaram perfeitamente registrados. Essa a razão de não ter caído na tentação de só publicar as melhores. Ao longo dessas 1500 micro crônicas que vale dizer 1500 dias, pude contar um pouco da história desses turbulentos anos pelos quais passou o nosso pobre país.
31 de Dezembro de 2016
30.12.16
Crônica diária
Eu não acredito
Custa crer que o que estamos vendo e lendo nos últimos dias possa ser verdade. Delatados como corruptos se defendendo dos delatores magoados com o codinome recebido. Disse que o ex-amigo e atual canalha Claudio Melo Filho (ex-diretor da Odebrecht) o apelidou de TODO FEIO e repassou 100 mil reais para sua campanha. O codinome é que pesou. Todo Feio, eu?
30 de Dezembro de 2016
Custa crer que o que estamos vendo e lendo nos últimos dias possa ser verdade. Delatados como corruptos se defendendo dos delatores magoados com o codinome recebido. Disse que o ex-amigo e atual canalha Claudio Melo Filho (ex-diretor da Odebrecht) o apelidou de TODO FEIO e repassou 100 mil reais para sua campanha. O codinome é que pesou. Todo Feio, eu?
30 de Dezembro de 2016
Comentários que valem um post
Tomaselli Maria Este:http://www.citador.pt/frases/citacoes/a/karl-kraus
Por Citador.pt
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- João Menéres disse...
- Gostei do trabalho cimeiro desta postagem.quinta-feira, 29 de dezembro de 2016 07:20:00 BRST
João Menéres disse...
- Teria interesse em conhecer trabalhos mais recentes da Isabel Braga.quinta-feira, 29 de dezembro de 2016 07:24:00 BRST*************************************************
29.12.16
Isabel Braga 2º parte
Isabel Braga, pintora e educadora.

Biografia
Isabel
Braga nasceu em 1914 em Muqui, Espírito Santo. Como educadora, dirigiu o
primeiro Jardim de Infância de Cachoeiro de Itapemirim e ensinou Artes
no Liceu Muniz Freire. Em 1950 criou a
Escolinha de Arte, também em Cachoeiro, introduzindo o conceito de
educação através da arte. Em meados dos anos 1940 Isabel começou a
retratar a paisagem e a vida dos pescadores da praia capixaba de
Marataízes, então um pequeno vilarejo onde sua família passava as férias
de verão, e assim, pouco a pouco desenvolveu uma bem sucedida carreira
de pintora primitiva. A principal qualidade de Isabel como artista está
em seu estilo inconfundível pela total expontâneamente em retratar o que
via e como sentia. Suas pinturas foram exibidas em vários estados do
Brasil, no Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, e
no exterior, como Los Angeles, San Diego e Washington, D.C., nos Estados
Unidos, e Milão e Roma, na Itália. Amante da música, de parceria com
seu marido, o poeta Newton Braga, compôs a marchinha "Marataízes", que
até hoje é considerada o hino do balneário capixaba. Isabel Braga
faleceu em 1987, no Rio de Janeiro.
Marataízes - os maratimbas tratando um cação martelo enorme.
Informa-nos Alvaro Abreu.
Trabalhos publicados em sua página no Facebook, onde outros podem ser vistos.
Crônica diária
Essa moda gay
Esta insuportável. Os últimos três livros que li tem personagens importantes gays, ou tratam do homossexualismo como pano de fundo. Comecei lendo "Jantar Secreto" do Raphael Montes e o narrador é uma bichinha. Depois li "O tribunal da quinta-feira" do Michel Laub e novamente o personagem coadjuvante é veado, e o tema é a AIDs. E por pura coincidência, ou não, li "Mascaras" do Leonardo Padura, onde o assassinado era um travesti. Parece que não há outra coisa a ser tratado pela literatura do que a liberação sexual. Virou moda. Quantos escritores eram bichas enrustidos, ou em alguns casos declarados, e as abordagens ao tema sempre eram discretas como podem e devem ser. Agora virou moda. Dirão: a literatura retrata seu tempo, hábitos e costumes, e direi: mas não pode ficar exaltando, com único foco essa característica humana, de minoria agressiva. Dá a impressão de que os invertidos sexuais são maioria. Ou é uma coisa naturalíssima. E não é.
Esta insuportável. Os últimos três livros que li tem personagens importantes gays, ou tratam do homossexualismo como pano de fundo. Comecei lendo "Jantar Secreto" do Raphael Montes e o narrador é uma bichinha. Depois li "O tribunal da quinta-feira" do Michel Laub e novamente o personagem coadjuvante é veado, e o tema é a AIDs. E por pura coincidência, ou não, li "Mascaras" do Leonardo Padura, onde o assassinado era um travesti. Parece que não há outra coisa a ser tratado pela literatura do que a liberação sexual. Virou moda. Quantos escritores eram bichas enrustidos, ou em alguns casos declarados, e as abordagens ao tema sempre eram discretas como podem e devem ser. Agora virou moda. Dirão: a literatura retrata seu tempo, hábitos e costumes, e direi: mas não pode ficar exaltando, com único foco essa característica humana, de minoria agressiva. Dá a impressão de que os invertidos sexuais são maioria. Ou é uma coisa naturalíssima. E não é.
28.12.16
Isabel Braga
RELATO
DE ISABEL DA ROCHA BRAGA APRESENTADO NO SEMINÁRIO DE ARTE NA EDUCAÇÃO
DA ESCOLINHA DE ARTE DO BRASIL SOBRE A ESCOLINHA DE ARTE DE CACHOEIRO DE
ITAPEMIRIM, ESPIRITO SANTO, QUE FUNDOU E DIRIGIU DE ABRIL DE 1950 A
1955.
MOTIVACÃO DA EXPERIÊNCIA
Em 1948, residindo em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, tomei conhecimento de uma inovação no processo de recreação artística aplicada à criança, através de notícias e reportagens nos jornais do Rio.
O criador desse movimento era o artista plástico e professor Augusto Rodrigues. Sua escolinha nessa ocasião funcionava com o nome de Escolinha de Arte da Biblioteca Castro Alves, do IPASE.
Interessada e curiosa de ver de perto seu trabalho, durante uma viagem ao Rio fui a ele apresentada por meu cunhado, Dirceu Nascimento, diretor da revista Manchete, ocasião que fui convidada e conhecer a Escolinha.
O que vi foi bastante para fixar-me a ideia de fazer algo parecido em Cachoeiro, a fim de proporcionar às crianças do lugar e aos meus próprios filhos aquela oportunidade, que logo me pareceu tão preciosa.
Naquela época eu não sabia nada sobre artes plásticas, nem ao menos tinha oportunidade de visitar exposições de arte, apenas tinha notícias de que tudo existia, e algum conhecimento muito superficial do desenvolvimento da pintura e seu progresso no mundo. Até então jamais havia me arvorado a pegar num lápis para desenhar.
Mas, se a mim foi negada essa oportunidade, percebi que, por aquele processo que vinha desenvolvendo o Prof. Augusto, qualquer um poderia tentá-la. No meu entender o ensino de desenho nas escolas primárias e secundárias era muito limitado. Nenhum aluno saía do colégio aproveitando alguma coisa que aprendia, para ser aplicada na prática. O que acontecia é que se formava um conceito pessoal em torno do desenho, de quem tinha ou não "jeito para desenhar", e os que poucos conseguiam realizar os deveres de desenho dados pelos professores, ajudavam o resto da classe.
E, na certeza de que o processo que havia visto na Escolinha do IPASE seria um passo definitivo para resolver aquela deficiência de ensino, tornei realidade o sonho de fazer algo a respeito.
A APLICACÃO DA EXPERIÊNCIA
Com o nome de Clube de Arte Recreativo de Cachoeiro de Itapemirim, batizei minha primeira experiência, em 1950. Antes vinha tentando fazer bonecos de fantoches, aprendendo através de aulas periódicas publicadas em jornal do Rio, e fazendo teatrinhos de fantoches em festinhas de aniversários de crianças.
Logo após consegui num clube social da cidade um contrato para duas apresentações durante a Semana da Criança, de uma pecinha teatral que escrevi e encenei com um grupo de jovens. Desse dinheirinho - Cr$500,00 comprei material de pintura, de desenho, balde para o barro, e comecei a trabalhar. As salas me foram emprestadas pelo Partido Socialista Brasileiro, que ocasionalmente se reunia ali à noite.
Levei meus filhos e seus amigos como cobaias. Espalhei prospectos do movimento, em correspondência particular e anúncios nos jornais. E mandei também a notícia para a Escolinha de Arte do IPASE, que imediatamente se mostrou interessada em meu trabalho.
O RESULTADO DA EXPERIÊNCIA
Nas férias de 1951 levei ao Prof. Augusto o resultado de meu trabalho, em forma de desenhos e pinturas das crianças. Embora recebesse sua aprovação, percebi que não poderia continuar naquelas condições tão precárias, com falta de tudo. Resolvi então acabar com a Escolinha no fim de 1950, durando ela, portanto, um ano. Mas continuei a persistir na ideia, escrevendo e publicando sobre a minha experiência e procurando uma maneira de continuá-la em melhores condições.
ENRIQUECIMENTO INDIVIDUAL
Em 1952, nas férias de começo de ano, voltei ao Rio e na Escolinha do IPASE encontrei funcionando na ocasião vários cursos: desenho, xilogravura, gravura em metal e silkscreen. Os alunos variavam de idade, desde crianças, jovens e até pessoas de idade. Imediatamente o Prof. Augusto me fez frequentar todos os cursos, de 8 às 20 horas diariamente. Para mim essas aulas eram dadas como as das crianças, inteiramente livres, apenas com a presença dos professores, incentivando, e embora as técnicas fossem por mim desconhecidas, despertaram-me um interesse indescritível, e uma satisfação só mesmo comparável à que eu descobria nos meus alunos enquanto trabalhavam.
E assim, voltando para Cachoeiro, tornei-me autodidata, na impossibilidade de frequentar aulas ou poder encontrar uma só pessoa que pudesse ministrá-las.
ASPECTOS CARACTERISTICOS E A REABERTURA DA ESCOLINHA DE ARTE DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM
Durante o curso, recebia do Prof. Augusto e de Lúcia Alencastro orientação sobre a experiência que eles ali realizavam com as crianças. Certo dia o professor induziu-me a requerer uma verba do Ministério da Educação, apresentando-me a Vera Simões, que gentilmente acompanhou-me até seu pai, o Ministro Simões Filho, e expos minhas dificuldades, pois, moça da roça que era, senti-me inibida a expor pessoalmente o que necessitava.
Voltando a Cachoeiro, para meu verdadeiro espanto recebi daí a dias a comunicação de que a verba havia sido concedida, e um cheque que $25.000. Imediatamente procurei um local que servisse para reabrir a Escola e, em março de 1952, pode ela reabrir-se com o nome de ESCOLINHA DE ARTE DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM, em caráter particular.
Além dessa verba, outra me foi concedida pela Associação de Proteção à Maternidade e Infância de Cachoeiro de Itapemirim, de $1,000, em troca de 10 bolsas de estudos para crianças pobres.
Mais tarde a Prefeitura local também concedeu outra verba de $500, com direito a matrículas gratuitas. Desses $1.500 cruzeiros, pagava mil de aluguel e $500 para uma ajudante. Com a verba do Ministério adquiri móveis, material de desenho, pintura, xilogravura e silkscreen, e depositei o restante para futuras despesas.
Explorando particularmente a técnica de silkscreen, no campo comercial, consegui desenvolver o restante do dinheiro depositado, e assim pude manter a Escolinha até 1995.
A Escolinha funcionou numa das ruas principais da cidade durante três anos, em dois turnos, pela manha e à tarde, com a duração de duas horas cada turno.
As atividades empregadas de começo foram: desenho, pintura, xilogravura, barro, fantoches, bonequinhos de arame, trançados de palhas e contas.
Além dessas aulas durante o dia, intercalei aulas de bordados para senhoras, três vezes por semana, duas horas à tarde e duas horas à noite, para atender às necessidades das que nãp podiam ir durante o dia.
Haviam duas salas de mais ou menos 5x4 m, e as mesas eram desmontáveis, para facilitar as festinhas proporcionadas às crianças. Mandei fazer banquinhos confortáveis e resistentes, armários fechados em baixo, com estantes por cima, sendo uma para exposição de objetos de barro e outra para livros.
A primeira secretária que contratei se divertia muito com a experiência e tinha para comigo um ar de riso suspeito, como quem duvidasse da minha competência ou da minha perfeita capacidade mental, por deixar que as crianças pintassem e desenhassem espontaneamente. Logo tive de dispensá-la, pois se achou no direito de ensinar as crianças a usarem as cores "certas". A função de secretária também correspondia a de ajudante de limpeza e tudo mais.
Além das salas citadas havia um quarto de banho completo, onde nos dias mais quente as crianças às vezes tomavam banho de chuveiro, pois a banheira de começo já havia sido transformada em depósito de barro.
Havia também uma cozinha pequena e uma varanda que dava para o rio Itapemirim, e outra na frente para a rua.
DESCOBERTAS FEITAS DURANTE A EXPERIÊNCIA
Alguns pais foram pessoalmente matricular os filhos, pagando a mensalidade de $80,00. Além dos bolsistas, matriculei os filhos da lavadeira e do pedreiro que construíra nossa casa. Esses alunos foram os maiores incentivadores do nosso trabalho, pela assiduidade e entusiasmo com que frequentavam as aulas, trazendo os companheiros da escola e vizinhos do bairro onde moravam.
Eles apareciam sujos e descalços, motivo pelo qual instituí o uso de avental uniforme, com as iniciais EACI.
A alegria desses meninos era contagiante, e a espontaneidade e simplicidade de seus trabalhos, tentando principalmente reproduzir a natureza do lugar onde viviam, deixavam transparecer toda felicidade que desfrutavam, como crianças livres que eram, de cidade do interior. Subiam as escadas correndo, numa ansiedade incontida para começar as aulas. As técnicas eram escolhidas por elas mesmas, e quase sempre optavam pela pintura e xilogravura. Enquanto trabalhavam conversavam sobre todos seus problemas, e quase sempre no final das aulas um grupinho dava à turma a surpresa de um espetáculo improvisado de fantoches, com as vozinhas muito características de neném, fazendo pilhérias com os companheiros.
Por incrível que pareça, não havia brigas dentro das aulas. O grupo vinha sempre junto e unido. Certo dia, um deles não apareceu e o grupo se isolou num silêncio e murmúrios, o que me deixou intrigada. Perguntei o que havia, não me responderam. Certo momento apareceu o atrasado, a quem recebi cordialmente, como de costume, mas eles se abstiveram de qualquer manifestação e se conservaram calados quando ele se aproximava.
Durante uns dias o enjeitado faltou, mas não me davam nenhuma notícia dele. Um dia apareceu sorrateiramente e desconfiado, permaneceu por alguns minutos na porta, olhou toda a sala e corajosamente se dirigiu a um do grupo e pediu desculpas. E tudo imediatamente voltou ao normal, como se nada tivesse acontecido. E se puseram a comentar a briga que haviam tido em suas brincadeiras.
Esse mesmo grupo organizou um conjunto de música com pandeiros de lata de goiabada, maracas de cabacinhas com cabos de vassouras serradas e contas de lágrimas, tamborins que trouxeram de casa, e uma flautinha de lata, que um deles de dez anos tocava de ouvido.
E EXPERIÊNCIA PARTICULAR EM CERAMICA
Como a cidade possui várias cerâmicas de fabricação manual, animei-me a fazer a experiência pessoal em uma delas, pois ia sempre lá encomendar vasos para minha coleção de plantas. O ceramista se prontificou a me ensinar suas técnicas, e fiquei durante quinze dias praticando num torno de pé, a seu lado, enquanto ele ia fazendo seus vasos e moringas. Observei que as crianças vizinhas começavam a se divertir nos tornos desocupados, tentando fazer o mesmo. Então mandei fazer um torno pequeno num marceneiro, e instalei-o na cozinha. De começo tentei ensinar a técnica de rodar a roda com o pé e equilibrar o barro no prato. Mas achei melhor experimentar e deixar que eles fizessem a tentativa sozinhos, pois a descoberta da técnica era para eles tão curiosa, como a das combinações de cores nas tintas. Eu me preocupava somente em ensinar-lhes o perigo de algum acidente com a roda, embora eles estivessem acostumamos a andar sozinhos pela cidade, pelas margens do rio, evidentemente acostumados a ele. De pronto se familiarizaram com o torno, chegaram a manejar o barro e a fazer muitos objetos, como pratos, cofres, vasilhas, esperando às vezes o endurecimento necessário para aplicar relevos altos e baixos.
Depois dos trabalhos prontos e convenientemente secos, levávamos os objetos de cerâmica para queimar, e depois de queimadas as crianças geralmente os pintavam e levavam para casa.
Considero a experiência importante pelos seguintes resultados obtidos:
a) como instrumento de criatividade e de recreação.
b) como exercício para o desgaste físico.
c) como incentivo à vontade de acertar, pelo esforço que faziam tentando equilibrar, levantar, contornar e abrir o barro.
d) pela coordenação motora do exercício, e levando-os a satisfazer a necessidade de criar coisas úteis.
No entanto não sei se realmente tudo isso convém à criança, foi apenas uma experiência em que tentei proporcionar mais uma inovação para suas recreações, sem nenhuma intenção didática.
PROBLEMAS DECORRENTES
Depois de uns dois anos, o trabalho se intensificou, com a minha nomeação para Professora de Artes Aplicadas no Colégio Estadual e Escola Normal Muniz Freire. Encerrei os cursos de bordados, e passei a explorar comercialmente o silkscreen, aceitando encomendas de flâmulas e cartazes.
Meus filhos atravessavam a puberdade e não havia mais na Escolinha ambiente para eles, junto às crianças. A exemplo da Escolinha do Rio, incentivei meus filhos à criação de um clube juvenil, e cedi a sala, depois das aulas das crianças, para que ali organizassem o clube, sobre minha supervisão. O livro de ata deste clube conta toda sua história. Mas mais tarde fui obrigada a fechar o clube, pelo fracasso da experiência, muito em parte pela minha falta de conhecimentos psicológicos que me permitissem conhecer melhor aqueles jovens e saber guiá-los convenientemente.
Passaram então a se reunir em minha casa, e ali recreavam e desenvolviam outras atividades que organizavam. Mas a minha presença em casa se fazia necessária, e sentia que não podia resistir ao trabalho por mais tempo.
A PRESENÇA DO PROFESSOR
Ao lado dessas dificuldades, as presenças do Prof. Augusto Rodrigues e Lucia Alencastro se faziam sentir através de um permanente intercâmbio de correspondência, animadora e esclarecedora. A Escolinha certa vez recebeu de surpresa a visita do Prof. Augusto, que viu, absorveu de perto e incentivou o nosso trabalho. Acredito que essa era a mola que impulsionava o trabalho, e sem ela teria jamais teria prosseguido por tanto tempo.
IMPACTO E RELAÇÕES COM A ESCOLA TRADICIONAL
Na verdade não houve impacto. Se os professores primários não chegaram a tomar parte ativa do movimento, também não se manifestaram contra. Alguns visitavam a Escolinha a convite meu, outros se limitavam a perguntar como ía indo. Da parte da imprensa sempre encontrei a maior colaboração, divulgando e até exaltando o trabalho. As exposições dos trabalhos dos alunos eram sempre muito concorridas, e sempre realizadas no dia da tradicional Festa da Cidade, e inauguradas pelos prefeitos, governadores e autoridades que ocupavam cargos administrativos nas ocasiões. Realmente houve boa aceitação, e nenhuma reação visivelmente desfavorável.
Quando fechei a Escolinha, fui convidada a dirigir o Jardim de Infância, o que cheguei a fazer durante um ano.
TENTATIVAS DE SOLUÇOES E SOLUÇAO ENCONTRADA
Os principais motivos que me levaram a encerrar os trabalhos na Escolinha foram a falta de recursos financeiros para ampliá-los, a necessidade pessoal de remuneração e a obrigação particular de dona de casa e mãe de família, que, com os filhos crescidos, mais se agravou.
Em 1955, ao mudar o governo do Estado, procurei solucionar o problema, tentando organizar uma sociedade jurídica (a Escolinha já havia sido declarada de "utilidade pública" pela Prefeitura e pelo Governo do Estado (leis 206, de 4.12.52 da P.M. e Lei 675, de 16.12.52, do Governo do Estado). Com a promessa de uma verba maior pela Prefeitura, aluguei um salão de 10 x 20 m, mais duas boas salas para secretaria, e instalações sanitárias independentes. As dependências davam de frente para a praça principal da cidade e fundos para o rio.
Aproveitando a visita do governador Francisco Lacerda de Aguiar e de seu secretariado à cidade, organizei uma grande exposição inclusive com trabalhos de crianças do Uruguai, cedidos pela Escolinha do Rio, que havia se mudado para sua nova sede já com o nome de Escolinha de Arte do Brasil.
A nova sede da nossa Escolinha foi convenientemente inaugurada com os trabalhos citados e os da nossa Escolhinha, e um quadro elucidativo sobre as exposições que Augusto Rodrigues fazia na Europa, com recortes de noticiários estrangeiros e demais documentos enviados da Europa.
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MOTIVACÃO DA EXPERIÊNCIA
Em 1948, residindo em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, tomei conhecimento de uma inovação no processo de recreação artística aplicada à criança, através de notícias e reportagens nos jornais do Rio.
O criador desse movimento era o artista plástico e professor Augusto Rodrigues. Sua escolinha nessa ocasião funcionava com o nome de Escolinha de Arte da Biblioteca Castro Alves, do IPASE.
Interessada e curiosa de ver de perto seu trabalho, durante uma viagem ao Rio fui a ele apresentada por meu cunhado, Dirceu Nascimento, diretor da revista Manchete, ocasião que fui convidada e conhecer a Escolinha.
O que vi foi bastante para fixar-me a ideia de fazer algo parecido em Cachoeiro, a fim de proporcionar às crianças do lugar e aos meus próprios filhos aquela oportunidade, que logo me pareceu tão preciosa.
Naquela época eu não sabia nada sobre artes plásticas, nem ao menos tinha oportunidade de visitar exposições de arte, apenas tinha notícias de que tudo existia, e algum conhecimento muito superficial do desenvolvimento da pintura e seu progresso no mundo. Até então jamais havia me arvorado a pegar num lápis para desenhar.
Mas, se a mim foi negada essa oportunidade, percebi que, por aquele processo que vinha desenvolvendo o Prof. Augusto, qualquer um poderia tentá-la. No meu entender o ensino de desenho nas escolas primárias e secundárias era muito limitado. Nenhum aluno saía do colégio aproveitando alguma coisa que aprendia, para ser aplicada na prática. O que acontecia é que se formava um conceito pessoal em torno do desenho, de quem tinha ou não "jeito para desenhar", e os que poucos conseguiam realizar os deveres de desenho dados pelos professores, ajudavam o resto da classe.
E, na certeza de que o processo que havia visto na Escolinha do IPASE seria um passo definitivo para resolver aquela deficiência de ensino, tornei realidade o sonho de fazer algo a respeito.
A APLICACÃO DA EXPERIÊNCIA
Com o nome de Clube de Arte Recreativo de Cachoeiro de Itapemirim, batizei minha primeira experiência, em 1950. Antes vinha tentando fazer bonecos de fantoches, aprendendo através de aulas periódicas publicadas em jornal do Rio, e fazendo teatrinhos de fantoches em festinhas de aniversários de crianças.
Logo após consegui num clube social da cidade um contrato para duas apresentações durante a Semana da Criança, de uma pecinha teatral que escrevi e encenei com um grupo de jovens. Desse dinheirinho - Cr$500,00 comprei material de pintura, de desenho, balde para o barro, e comecei a trabalhar. As salas me foram emprestadas pelo Partido Socialista Brasileiro, que ocasionalmente se reunia ali à noite.
Levei meus filhos e seus amigos como cobaias. Espalhei prospectos do movimento, em correspondência particular e anúncios nos jornais. E mandei também a notícia para a Escolinha de Arte do IPASE, que imediatamente se mostrou interessada em meu trabalho.
O RESULTADO DA EXPERIÊNCIA
Nas férias de 1951 levei ao Prof. Augusto o resultado de meu trabalho, em forma de desenhos e pinturas das crianças. Embora recebesse sua aprovação, percebi que não poderia continuar naquelas condições tão precárias, com falta de tudo. Resolvi então acabar com a Escolinha no fim de 1950, durando ela, portanto, um ano. Mas continuei a persistir na ideia, escrevendo e publicando sobre a minha experiência e procurando uma maneira de continuá-la em melhores condições.
ENRIQUECIMENTO INDIVIDUAL
Em 1952, nas férias de começo de ano, voltei ao Rio e na Escolinha do IPASE encontrei funcionando na ocasião vários cursos: desenho, xilogravura, gravura em metal e silkscreen. Os alunos variavam de idade, desde crianças, jovens e até pessoas de idade. Imediatamente o Prof. Augusto me fez frequentar todos os cursos, de 8 às 20 horas diariamente. Para mim essas aulas eram dadas como as das crianças, inteiramente livres, apenas com a presença dos professores, incentivando, e embora as técnicas fossem por mim desconhecidas, despertaram-me um interesse indescritível, e uma satisfação só mesmo comparável à que eu descobria nos meus alunos enquanto trabalhavam.
E assim, voltando para Cachoeiro, tornei-me autodidata, na impossibilidade de frequentar aulas ou poder encontrar uma só pessoa que pudesse ministrá-las.
ASPECTOS CARACTERISTICOS E A REABERTURA DA ESCOLINHA DE ARTE DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM
Durante o curso, recebia do Prof. Augusto e de Lúcia Alencastro orientação sobre a experiência que eles ali realizavam com as crianças. Certo dia o professor induziu-me a requerer uma verba do Ministério da Educação, apresentando-me a Vera Simões, que gentilmente acompanhou-me até seu pai, o Ministro Simões Filho, e expos minhas dificuldades, pois, moça da roça que era, senti-me inibida a expor pessoalmente o que necessitava.
Voltando a Cachoeiro, para meu verdadeiro espanto recebi daí a dias a comunicação de que a verba havia sido concedida, e um cheque que $25.000. Imediatamente procurei um local que servisse para reabrir a Escola e, em março de 1952, pode ela reabrir-se com o nome de ESCOLINHA DE ARTE DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM, em caráter particular.
Além dessa verba, outra me foi concedida pela Associação de Proteção à Maternidade e Infância de Cachoeiro de Itapemirim, de $1,000, em troca de 10 bolsas de estudos para crianças pobres.
Mais tarde a Prefeitura local também concedeu outra verba de $500, com direito a matrículas gratuitas. Desses $1.500 cruzeiros, pagava mil de aluguel e $500 para uma ajudante. Com a verba do Ministério adquiri móveis, material de desenho, pintura, xilogravura e silkscreen, e depositei o restante para futuras despesas.
Explorando particularmente a técnica de silkscreen, no campo comercial, consegui desenvolver o restante do dinheiro depositado, e assim pude manter a Escolinha até 1995.
A Escolinha funcionou numa das ruas principais da cidade durante três anos, em dois turnos, pela manha e à tarde, com a duração de duas horas cada turno.
As atividades empregadas de começo foram: desenho, pintura, xilogravura, barro, fantoches, bonequinhos de arame, trançados de palhas e contas.
Além dessas aulas durante o dia, intercalei aulas de bordados para senhoras, três vezes por semana, duas horas à tarde e duas horas à noite, para atender às necessidades das que nãp podiam ir durante o dia.
Haviam duas salas de mais ou menos 5x4 m, e as mesas eram desmontáveis, para facilitar as festinhas proporcionadas às crianças. Mandei fazer banquinhos confortáveis e resistentes, armários fechados em baixo, com estantes por cima, sendo uma para exposição de objetos de barro e outra para livros.
A primeira secretária que contratei se divertia muito com a experiência e tinha para comigo um ar de riso suspeito, como quem duvidasse da minha competência ou da minha perfeita capacidade mental, por deixar que as crianças pintassem e desenhassem espontaneamente. Logo tive de dispensá-la, pois se achou no direito de ensinar as crianças a usarem as cores "certas". A função de secretária também correspondia a de ajudante de limpeza e tudo mais.
Além das salas citadas havia um quarto de banho completo, onde nos dias mais quente as crianças às vezes tomavam banho de chuveiro, pois a banheira de começo já havia sido transformada em depósito de barro.
Havia também uma cozinha pequena e uma varanda que dava para o rio Itapemirim, e outra na frente para a rua.
DESCOBERTAS FEITAS DURANTE A EXPERIÊNCIA
Alguns pais foram pessoalmente matricular os filhos, pagando a mensalidade de $80,00. Além dos bolsistas, matriculei os filhos da lavadeira e do pedreiro que construíra nossa casa. Esses alunos foram os maiores incentivadores do nosso trabalho, pela assiduidade e entusiasmo com que frequentavam as aulas, trazendo os companheiros da escola e vizinhos do bairro onde moravam.
Eles apareciam sujos e descalços, motivo pelo qual instituí o uso de avental uniforme, com as iniciais EACI.
A alegria desses meninos era contagiante, e a espontaneidade e simplicidade de seus trabalhos, tentando principalmente reproduzir a natureza do lugar onde viviam, deixavam transparecer toda felicidade que desfrutavam, como crianças livres que eram, de cidade do interior. Subiam as escadas correndo, numa ansiedade incontida para começar as aulas. As técnicas eram escolhidas por elas mesmas, e quase sempre optavam pela pintura e xilogravura. Enquanto trabalhavam conversavam sobre todos seus problemas, e quase sempre no final das aulas um grupinho dava à turma a surpresa de um espetáculo improvisado de fantoches, com as vozinhas muito características de neném, fazendo pilhérias com os companheiros.
Por incrível que pareça, não havia brigas dentro das aulas. O grupo vinha sempre junto e unido. Certo dia, um deles não apareceu e o grupo se isolou num silêncio e murmúrios, o que me deixou intrigada. Perguntei o que havia, não me responderam. Certo momento apareceu o atrasado, a quem recebi cordialmente, como de costume, mas eles se abstiveram de qualquer manifestação e se conservaram calados quando ele se aproximava.
Durante uns dias o enjeitado faltou, mas não me davam nenhuma notícia dele. Um dia apareceu sorrateiramente e desconfiado, permaneceu por alguns minutos na porta, olhou toda a sala e corajosamente se dirigiu a um do grupo e pediu desculpas. E tudo imediatamente voltou ao normal, como se nada tivesse acontecido. E se puseram a comentar a briga que haviam tido em suas brincadeiras.
Esse mesmo grupo organizou um conjunto de música com pandeiros de lata de goiabada, maracas de cabacinhas com cabos de vassouras serradas e contas de lágrimas, tamborins que trouxeram de casa, e uma flautinha de lata, que um deles de dez anos tocava de ouvido.
E EXPERIÊNCIA PARTICULAR EM CERAMICA
Como a cidade possui várias cerâmicas de fabricação manual, animei-me a fazer a experiência pessoal em uma delas, pois ia sempre lá encomendar vasos para minha coleção de plantas. O ceramista se prontificou a me ensinar suas técnicas, e fiquei durante quinze dias praticando num torno de pé, a seu lado, enquanto ele ia fazendo seus vasos e moringas. Observei que as crianças vizinhas começavam a se divertir nos tornos desocupados, tentando fazer o mesmo. Então mandei fazer um torno pequeno num marceneiro, e instalei-o na cozinha. De começo tentei ensinar a técnica de rodar a roda com o pé e equilibrar o barro no prato. Mas achei melhor experimentar e deixar que eles fizessem a tentativa sozinhos, pois a descoberta da técnica era para eles tão curiosa, como a das combinações de cores nas tintas. Eu me preocupava somente em ensinar-lhes o perigo de algum acidente com a roda, embora eles estivessem acostumamos a andar sozinhos pela cidade, pelas margens do rio, evidentemente acostumados a ele. De pronto se familiarizaram com o torno, chegaram a manejar o barro e a fazer muitos objetos, como pratos, cofres, vasilhas, esperando às vezes o endurecimento necessário para aplicar relevos altos e baixos.
Depois dos trabalhos prontos e convenientemente secos, levávamos os objetos de cerâmica para queimar, e depois de queimadas as crianças geralmente os pintavam e levavam para casa.
Considero a experiência importante pelos seguintes resultados obtidos:
a) como instrumento de criatividade e de recreação.
b) como exercício para o desgaste físico.
c) como incentivo à vontade de acertar, pelo esforço que faziam tentando equilibrar, levantar, contornar e abrir o barro.
d) pela coordenação motora do exercício, e levando-os a satisfazer a necessidade de criar coisas úteis.
No entanto não sei se realmente tudo isso convém à criança, foi apenas uma experiência em que tentei proporcionar mais uma inovação para suas recreações, sem nenhuma intenção didática.
PROBLEMAS DECORRENTES
Depois de uns dois anos, o trabalho se intensificou, com a minha nomeação para Professora de Artes Aplicadas no Colégio Estadual e Escola Normal Muniz Freire. Encerrei os cursos de bordados, e passei a explorar comercialmente o silkscreen, aceitando encomendas de flâmulas e cartazes.
Meus filhos atravessavam a puberdade e não havia mais na Escolinha ambiente para eles, junto às crianças. A exemplo da Escolinha do Rio, incentivei meus filhos à criação de um clube juvenil, e cedi a sala, depois das aulas das crianças, para que ali organizassem o clube, sobre minha supervisão. O livro de ata deste clube conta toda sua história. Mas mais tarde fui obrigada a fechar o clube, pelo fracasso da experiência, muito em parte pela minha falta de conhecimentos psicológicos que me permitissem conhecer melhor aqueles jovens e saber guiá-los convenientemente.
Passaram então a se reunir em minha casa, e ali recreavam e desenvolviam outras atividades que organizavam. Mas a minha presença em casa se fazia necessária, e sentia que não podia resistir ao trabalho por mais tempo.
A PRESENÇA DO PROFESSOR
Ao lado dessas dificuldades, as presenças do Prof. Augusto Rodrigues e Lucia Alencastro se faziam sentir através de um permanente intercâmbio de correspondência, animadora e esclarecedora. A Escolinha certa vez recebeu de surpresa a visita do Prof. Augusto, que viu, absorveu de perto e incentivou o nosso trabalho. Acredito que essa era a mola que impulsionava o trabalho, e sem ela teria jamais teria prosseguido por tanto tempo.
IMPACTO E RELAÇÕES COM A ESCOLA TRADICIONAL
Na verdade não houve impacto. Se os professores primários não chegaram a tomar parte ativa do movimento, também não se manifestaram contra. Alguns visitavam a Escolinha a convite meu, outros se limitavam a perguntar como ía indo. Da parte da imprensa sempre encontrei a maior colaboração, divulgando e até exaltando o trabalho. As exposições dos trabalhos dos alunos eram sempre muito concorridas, e sempre realizadas no dia da tradicional Festa da Cidade, e inauguradas pelos prefeitos, governadores e autoridades que ocupavam cargos administrativos nas ocasiões. Realmente houve boa aceitação, e nenhuma reação visivelmente desfavorável.
Quando fechei a Escolinha, fui convidada a dirigir o Jardim de Infância, o que cheguei a fazer durante um ano.
TENTATIVAS DE SOLUÇOES E SOLUÇAO ENCONTRADA
Os principais motivos que me levaram a encerrar os trabalhos na Escolinha foram a falta de recursos financeiros para ampliá-los, a necessidade pessoal de remuneração e a obrigação particular de dona de casa e mãe de família, que, com os filhos crescidos, mais se agravou.
Em 1955, ao mudar o governo do Estado, procurei solucionar o problema, tentando organizar uma sociedade jurídica (a Escolinha já havia sido declarada de "utilidade pública" pela Prefeitura e pelo Governo do Estado (leis 206, de 4.12.52 da P.M. e Lei 675, de 16.12.52, do Governo do Estado). Com a promessa de uma verba maior pela Prefeitura, aluguei um salão de 10 x 20 m, mais duas boas salas para secretaria, e instalações sanitárias independentes. As dependências davam de frente para a praça principal da cidade e fundos para o rio.
Aproveitando a visita do governador Francisco Lacerda de Aguiar e de seu secretariado à cidade, organizei uma grande exposição inclusive com trabalhos de crianças do Uruguai, cedidos pela Escolinha do Rio, que havia se mudado para sua nova sede já com o nome de Escolinha de Arte do Brasil.
A nova sede da nossa Escolinha foi convenientemente inaugurada com os trabalhos citados e os da nossa Escolhinha, e um quadro elucidativo sobre as exposições que Augusto Rodrigues fazia na Europa, com recortes de noticiários estrangeiros e demais documentos enviados da Europa.
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Isabel Braga
Tive o imenso prazer de receber um comentário da filha de Isabel, na noite de Natal. Marília Braga, filha de Newton Braga. Newton era irmão mais velho do Rubem Braga. Logo estamos falando dessa família de Cachoeiiro no Espírito Santo, Além de poetas, escritores, uma artista plástica que tenho a honra de recepcionar aqui no Varal.
Crônica diária
Cheiro de juventude
Leonardo que só tem três anos mais do
que eu conversamos esta semana. Eu comecei dizendo que estava achando-o muito
bem fisicamente. Ele confirmou que nunca se sentiu melhor. E retruquei que não
era para tanto. Rimos. Depois comentou sobre o livro que dei para ele ler. A
biografia do Rubem Braga. E ele citou o fato do Braga ter morrido com a sua
idade. Eu concordei, mas disse que o Rubem parecia mais velho.E bebeu muito
mais... Leonardo abaixou a cabeça, parecia estar procurando alguma coisa na
ponta do sapato, e ponderou, câncer não tem idade. E naquele tempo ainda era
pior. Mas vamos falar de coisas boas da vida e não da morte do Rubem. É verdade,
e o livro tem passagens deliciosas. Aquela em que ele se diz estar ficando
broxa, e que teve que ir ao dicionário para saber se broxa era com ch ou com x,
é muito divertida. Pois é, disse o Leonardo, a gente vai ficando velho mas não
perde-se o faro. Como assim? perguntei. Ontem fui ao Silverinha, que para quem
não sabe é um mercado bem simples, com umas dez gôndolas, de tudo um pouco, e
cruzei com duas jovenzinhas de quinze ou dezesseis anos, vestidinhas com
uniforme escolar, saia azul, blusa sem porta seios, e meias soquete brancas com
sapato preto. Saia pelo joelho. Passaram por mim entretidas entre si. Mas pude
sentir o cheiro maravilhoso do viço juvenil. Sem nenhum cuidado especial,
cabelos soltos, nenhuma maquiagem, exalam um aroma de fruta fresca. Por acaso
estávamos longe da banca de frutas. Caso contrário o cheiro de manga
rosa, e outras da estação confundiriam o aroma suave, mas característico, de
fruta saborosa que tinham as meninas inocentes e altamente virginais. A pele
que parecia de pêssegos maduros. Os gestos espontâneos e sem afetação. A
alegria estampada nos olhos brilhantes e no sorriso de canto de boca, fruto de
algum comentário sacana que segredavam entre si. E tudo isso em frações de
segundos. Passaram por mim, e deixaram todas essas lembranças e referências.
Foram para o caixa e de lá para a vida. Leonardo suspirou, e parecia vinte anos
mais jovem. Uma semana depois desse encontro e dialogo leio no
"Mascaras" de Leonardo Padura: "...nunca pude me negar à contemplação
às vezes desesperada da beleza de uma moça em flôr, porque estou
convencido de que não há outra beleza terrena que supere esse calor que brota
da juventude".
Comentários que valem um post
Tariel Djigaouri Abri
o Dance comigo e, além estar impaciente para descobrir as primeiras
crônicas, descobri uma gentil dedicatória que o autor com notável
discrição não apontou quando me presenteou com o livro e que eu não tive
a presença de espírito de procurar na hora. Vamos pôr esta falha na
conta dos copos de vinho que o Lunardelli, ele again, me serviu.
Tenho que agradecer duplamente.
Tenho que agradecer duplamente.
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27.12.16
Crônica diária
Memória de um par de joelhos
A culpa é toda do Marco Antonio de Carvalho que
escreveu a biografia do Rubem Braga com 610 páginas. A cada dez que leio vem-me
um assunto para nova crônica. Por exemplo lá na 366º que li:
",,,abandonaria de bom grado as palavras, com as quais luto há decadas
para tornar-me um pintor. Um pintor pode convidar uma jovem ao seu quarto e
propor desenha-la em toda sua beleza. O cronista nunca poderá dizer:
"Apareça lá em casa paqra que eu escreva sobre seu joelho esquerdo."
Eu mesmo como pintor que já fui fiz muito esses convites. E como cronista, que
estou, posso contar que quando jovem apaixonei-me por um par de joelhos. Por
pés não é novidade. Todo mundo sabe desse meu fetiche. Mas joelhos foram só de
uma linda ruiva. Era tão autêntica que além de pelos pubianos ruivos tinha nos
joelhos pintinhas avermelhadas como ovós de codorna. Não posso esquecer. Eram
dois lindos joelhos juvenis.
26.12.16
Crônica diária
Uma queda
Bastaram umas três horas sob um guarda sol, sol de 35º, para depois de
um almoço onde tomei um copo de vinho tinto argentino, muito bom, acabar
tendo uma queda de pressão. Acostumado com o clima ameno e frio de
Santa Catarina, para neste Natal em São Paulo, estranhar o calor
insuportável da chegada do verão. Foi um desmaio relâmpago. Um pequeno
apagão. Mas o suficiente para que caísse de costas, amparado pelos dois
cotovelos, e imediatamente voltar a ver duas ou três pessoas curvadas
sobre mim. "Você esta bem? " "O que aconteceu?" E levantei dizendo:
"Apaguei, mas estou bem." A quatro metros a mulher de um primo assistiu
a tudo. Fui até ela, cumprimentei, perguntei pelo marido, e voltei a
sentar num sofá. Aguardei uns minutos, peguei meu carro e fui pra casa.
Se morrer é isso, apagar e pronto, estou pronto pra morrer. Tirando a
dor nos cotovelos, a sensação da perda de pressão foi muito boa.
Comentários que valem um post
Marilia Braga disse...
Oi, sou Marilia, filha de Newton Braga. Minha prima Beatriz (irmã do Álvaro) falou-me de você, do seu blog, e de sua curiosidade sobre um dos meus personagens favoritos - meu pai. Então vim futucar seu blog, que aliás gostei muito, cheio de assuntos e fotos interessantes, vou ficar freguesa. Quanto a Newton, gostaria de mandar-lhe o livro "Newton Braga, Cachoeirense Ausente", que meus irmãos Rachel, Edson e eu organizamos, sob patrocínio da prefeitura de Cachoeiro, comemorando o centenário de nascimento dele. Se desejar recebê-lo, por favor mande seu endereço. Um abraço, Marilia Braga PS - Outra pessoa interessante foi minha mãe Isabel Braga, pintora e educadora (com isenção da minha parte, é claro...), se quiser conhecê-la um pouco, está no facebook.

Oi, sou Marilia, filha de Newton Braga. Minha prima Beatriz (irmã do Álvaro) falou-me de você, do seu blog, e de sua curiosidade sobre um dos meus personagens favoritos - meu pai. Então vim futucar seu blog, que aliás gostei muito, cheio de assuntos e fotos interessantes, vou ficar freguesa. Quanto a Newton, gostaria de mandar-lhe o livro "Newton Braga, Cachoeirense Ausente", que meus irmãos Rachel, Edson e eu organizamos, sob patrocínio da prefeitura de Cachoeiro, comemorando o centenário de nascimento dele. Se desejar recebê-lo, por favor mande seu endereço. Um abraço, Marilia Braga PS - Outra pessoa interessante foi minha mãe Isabel Braga, pintora e educadora (com isenção da minha parte, é claro...), se quiser conhecê-la um pouco, está no facebook.
domingo, 25 de dezembro de 2016 11:22:00 BRST
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25.12.16
Crônica diária
Aqui tem coisas
Depois de um intervalo de dois ou três livros volto às páginas do "Rubem
Braga - Um cigano fazendeiro do ar" do Marco Antonio de Carvalho.
Sinto-me envergonhado por não ter lido nenhum texto do irmão mais velho
Newton Braga de quem o livro fala muito, e bem. Carlos Lacerda, amigo
de ambos chega dizer: "O verdadeiro Rubem é o Newton." E o Rubem nunca
disse o contrário. Tão gostoso ler e conhecer detalhes da vida dessa
família de Cachoeiro, no Espírito Santo, quanto ler suas crônicas
mineiras de Belo Horizonte, e depois do Rio onde morou. Hoje recebi mais
uma crônica do sobrinho do Rubem, Álvaro Abreu, publicada no Gazeta de
Vitória, e que reproduzo no meu blog Varal. Falamos por e-mail sobre uma
reportagem em que o Antônio Prata elogia o tio, e cita como um bom
exemplo da melhor crônica do Rubem, a de um nadador no mar.
Coincidentemente o Álvaro responde que por ter nadado durante 10 anos a
crônica do tio também é a sua favorita. E para encerrar o assunto
crônico, desafiei meu velho amigo Osny Silveira a ler as minhas, uma vez
que disse estar pensando em deixar de frequentar o FB por absoluto
desinteresse pelos assuntos tratados. Eu concordo que não é exatamente o
lugar para se buscar leitura útil, A não ser a página da Sheila Learner
tenho pouco interesse nessa rede social. Quanto ao jornal digital
Antagonista do Mainardi, concordo com o Osny, mais uma vez, é o melhor
lugar para se informar do mundo político. Termino por onde iniciei. Na
falta de um título para este texto que trata de tantas coisas, além das
crônicas, lancei mão do título do blog e livro do Fernando Stickel : "
Aqui tem coisas."
24.12.16
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Falaram do Varal:
"...o Varal de Ideias é uma referência de como um blog deve ser ." Agnnes
(Caminhos e Atalhos, no mundo dos blogs)..."parabéns pelo teu exemplo de como realmente se faz um blog...ou melhor tantos e sempre outstandings...".
(Vi Leardi )
